Conversas de ônibus…

Andar de ônibus é sempre uma aventura diferente, seja pela maneira com os motoristas conduzem o veículo, seja pela companhia que se encontra ou ainda pelo que se ouve em alguns minutos na lotação urbana.

Na faculdade, tive a graça de receber uma premiação por um texto que fiz sobre telefones sem fio e telefones celulares, no texto eu argumentava que o telefone sem fio trouxe liberdade para as pessoas, ao passo que telefones celulares trouxeram prisão. Hoje, depois de anos de evolução dos telefones celulares vejo que a prisão também deixou os ônibus mais chatos.

Graças as tecnologias com rádio no celular, internet no celular, televisão no celular e até a já ultrapassada mensagem de texto no celular, os papos no ônibus não são mais os mesmos. A maioria das pessoas se esconde “atrás” de seus fones de ouvido, e curtem a si mesmo durante todo o trajeto. Pena, não dividem com ninguém histórias pitorescas.

No ônibus de hoje, ouvi apenas dois casos interessantes: uma senhora ruiva que aparentava uns 50 anos comentava com o motorista que ela não poderia mais pegar o ônibus naquele horário porque o filho arrumara emprego, e a creche só poderia pegar o sobrinho dela  a partir das 07h30, então, como ela tinha um horário mais flexível iria se sacrificar pelo filho. Entre um lamento e outro, comentou como a mãe da criança era uma mulher sem juízo, que viajava muito e pouco via a criança.

Na outra ponta do ônibus um senhor, segurando uma sacola de supermercado recheada de exames, contava a outro senhor, igualmente interessado na história, como era um homem sofredor. Doía suas costas, suas pernas, sua cabeça, tinha um problema de gastrite, não podia andar muito  porque as câimbras já lhe atacavam e agora deu de esquecer das coisas. Será que ele lembrava onde estava indo? Sim, era para outro médico ver os seus exames. Clássico.

Já chegando ao final de minha “viagem” ouvi o começo de uma história, mas me parte o coração contar-lhes que não sei o final. Dava conta de um jovem que devia ter pouco mais de 20 anos falando com sua mãe. Dizia ele que em seu novo trabalho havia uma moça muito bonita que queria porque queria levá-lo a igreja para falar com o pastor, pois, segundo ela, o rapaz estava com o demônio no corpo… sim, não sei o resto da história.

Não fiquem bravos, há muitas outras histórias pitorescas para dividir, e fica uma dica, já que seria audacioso demais chamá-lo de conselho. Deixe seu carro em casa ao menos uma vez por semana e vá de ônibus e veja seu caminho por outro ângulo, garanto que você vai se surpreender.

Ok, sou culpado!

Colocam a “culpa” da falta de passageiros no transporte público nos preços dos carros, baixos, quando o correto seria discutirmos a qualidade do transporte oferecido a população.

Sou, segundo as estatísticas, um dos culpados pelo trânsito caótico de Curitiba, venho trabalhar de carro, sozinho (até já procurei alguém para dar carona, mas sem sorte) e vou para casa em horário de pico. Via de costume, uso o sistema público ao menos uma vez por semana, para poder avaliar, ter condições de escrever esse texto e claro, saber das “últimas” que todos os ônibus oferecem.

Mas vamos lá, quando venho de carro gasto cerca de 10 minutos para vir e cerca de 20 para voltar. Somando aqui, diminuindo ali o meu gasto é por “viagem” é de cerca de R$ 3. O meu carro tem som, posso trocar o cd ou ligar a rádio que quiser, não fico em momento algum “apertado” e posso a qualquer momento parar o carro, abrir o vidro.

Quando estou de ônibus, tenho que esperar cerca de 25 minutos para o ônibus chegar, quando chega, tenho que torcer que a fila que me separa da porta de entrada não “entupa” o ônibus antes de eu alcançar o degrau do desejo. Tenho que gastar R$ 2,20 para vir + R$ 2,20 para voltar. Tenho que enfrentar a cara feia do cobrador me censurando por eu não ter o cartão transporte e ele tem que me dar troco (se todos tivessem o cartão, para que serviria o cobrador?).

No trajeto, o ônibus para várias vezes tentando provar que Newton estava errado, e sim, é possível colocar mais de um corpo no mesmo espaço. Enquanto faço uma épica guerra em busca do meu direito de permanecer em pé e conseguir chegar ao meu destino, vejo pelas janelas que os carros estão na mesma “tocada” que o ônibus, na mesma pista e com a mesma velocidade, mas eles não estão apertados e sim, estão economizando.

Você pode argumentar comigo que a coletividade deve vencer a individualidade, e eu concordo, mas qual é o incentivo para isso? Não lhe parece razoável que nos horários de pico fossem proibidos os micro-ônibus? Não seria no mínimo inteligente que os ônibus gozassem de faixas exclusivas, ao menos em horários específicos?

Sim, eu gostaria muito de deixar meu carro todos os dias na garagem e poder usar o trajeto do ônibus em agradáveis conversas ou em enriquecedoras leituras. Mas enquanto o discurso vazio dos políticos se sobrepuserem a prática, continuarei sendo culpado pelo caótico trânsito de Curitiba.